Jocelyne Gacel-Ávila: Não vejo a existência de currículos integrados atualmente

Publicado el 10 DE JUNIO, 2018

“Não vejo a existência de currículos integrados atualmente”

Pesquisadora Jocelyne Gacel-Ávila avalia que quadro de internacionalização e integração regional aprofunda desigualdades na América Latina e Caribe


Marcílio Lana / A coordenadora do eixo “Educação Superior, Internacionalização e integração da América Latina e Caribe” da III Conferência Regional da Educação Superior (CRES 2018), que também é coordenadora do Observatório Regional sobre Internacionalização e Redes em Educação Terciária da América Latina e Caribe (OBIRET), Jocelyne Gacel-Ávila, avalia que o processo de integração na região ainda tem um caminho longo e tortuoso pela frente.

Quais serão as discussões do eixo “Educação Superior, internacionalização e integração da América Latina e Caribe” durante a CRES 2018?

Durante debate sobre o eixo "Educação Superior, Internacionalização e Integração na América Latina e no Caribe" serão apresentados resultados de um estudo único que oferece informações importantes sobre as características do processo de internacionalização das instituições de ensino superior na região e esperamos que possa ajudar a fornecer feedback sobre as práticas atuais e um melhor planejamento e tomada de decisões políticas. Estará presente, também, a discussão sobre a importância da internacionalização da formação de professores para que a região possa atualizar seus modelos educacionais e capacitar os alunos com as competências internacionais e interculturais demandadas pelo contexto global de hoje. Também serão apresentados dados sobre a internacionalização da pesquisa e produção de conhecimento e sobre as características da cooperação internacional em nossa região.

Apenas 5,2% dos universitários no mundo usufruem da possibilidade de mobilidade. Como é a situação na América Latina e Caribe? Quais os desafios da região?


Na América Latina e Caribe, a mobilidade estudantil é uma das mais baixas do mundo, apenas 0,9% do total de matrículas. A Ásia tem 27%, a Europa do Oeste e a América do Norte têm 15%, a Europa Central e Oriental 10% e a África Subsaariana 7%. A América Latina e Caribe recebe apenas 2,2% dos estudantes internacionais do mundo, o que representa 0,3% de suas matrículas. A maioria desses estudantes é da própria América Latina. A região deve estabelecer mais políticas públicas e institucionais para aumentar a mobilidade e dedicar mais recursos, especialmente para os alunos mais desfavorecidos. Os atuais esquemas de mobilidade favorecem mais estudantes oriundos de famílias que detém mais recursos socioeconômicos. Isso amplia a disparidade em uma região que já é caracterizada por uma das mais altas desigualdades do mundo. Os governos devem estabelecer políticas a esse respeito e as instituições de ensino superior devem melhorar seus serviços para estudantes internacionais e profissionalizar mais seus escritórios encarregados da projeção internacional e a coordenação do processo de internacionalização.


Nos últimos anos, o Brasil implementou o programa Ciência Sem Fronteiras, que tinha como objetivo intensificar a internacionalização da ciência e tecnologia e possibilitava o intercâmbio estudantil de alunos das universidades públicas desde a graduação. O programa foi descontinuado por conta da crise econômica. Como a senhora vê o exemplo do Ciências Sem Fronteiras?


O programa "Ciência Sem Fronteiras" foi uma experiência única e muito interessante. Foi possível movimentar cerca de 100.000 estudantes em 40 países diferentes, o que colocou o Brasil no mapa mundial da educação internacional. Os estudantes brasileiros fizeram muito bem o papel nas universidades estrangeiras e mostraram a qualidade do sistema educacional brasileiro. Talvez a maior crítica feita ao programa é que ele era free movers. Ou seja, com controle das atividades nas mãos dos alunos, independentemente das instituições de origem. Isso não permitiu que as instituições se beneficiassem desse programa de internacionalização e das relações de colaboração com instituições estrangeiras.

É possível pensar em currículos integrados, já feitos pensando no intercâmbio de estudantes e pesquisadores na América Latina e Caribe, como tem feito a União Europeia?


A região não tem o fato de seus governos estarem envolvidos no processo de integração, promovendo o princípio da supranacionalidade. Deve haver um acordo formal por parte de todos os governos para direcionar a integração acadêmica, bem como acordos específicos entre os diferentes ministérios da educação superior na região. Não vejo a existência de currículos integrados na situação atual, já que a América Latina e Caribe é uma das poucas regiões do mundo que não conseguiu ratificar a Convenção da UNESCO sobre o reconhecimento de títulos e créditos.


Declaración final